19 novembro 2011

Lula careca, FHC cabeludo

Entre eles, quem enfrentou melhor o leão da crise internacional?

Marco Damiani - 17 de Novembro de 2011 - 247

Na reportagem, mais de meia dúzia de vezes entrevistei Fernando Henrique Cardoso. Aqui, no dia de seus 80 anos, elogiei sua prática democrática – e me chamaram de fernandista...

Lula conheço desde Vila Euclides, no final dos anos 70, quando ele brincava com seus parceiros distribuindo beliscões nas partes baixas, comandando a massa como se fosse um igual que sabia, por isso mesmo, ser o líder. Escrevi ontem, em texto que virou manchete do 247, que, ao ficar careca, Lula criou um fato político capaz de mudar o curso da sucessão presidencial de 2014. Um leitor, ao menos, cravou que eu sou lulista...

Meu registro profissional no Ministério do Trabalho tem o número 15.077. Não sou nada do FH nem do Lula. Sou jornalista. Que procura falar com o maior número possível de fontes. Entre elas, esses dois personagens (Lula também me recebeu com exclusividade mais de uma vez).

Lembrando do que eles disseram a mim, do que se pode somar pelo posicionamento deles que leio ao longo dos anos pela imprensa, do que sabemos todos sobre o que pensam, de que modo agem, como conduziram o País, me ocorreu comparar como ambos enfrentaram a crise econômica externa. Como eles são diferentes!

FHC sempre justificou, a mim e a todos os colegas, em discursos e artigos, que o baixo crescimento econômico registrado em seus oito anos de poder (1995-2002) se explicava em razão das crises econômicas no mundo daquele tempo. Houve a Rússia, a Turquia, as turbulências na Ásia. Seu ministro da Fazenda de todos os dois mandatos, Pedro Malan, igualmente atribuiu aos problemas externos o fato de não ter podido fazer mais pela nossa economia (e fez muito, na boa...). Estável, o Brasil mais marcou passo no lugar do que avançou.

A pergunta é: como os tucanos teriam se comportado diante do tamanho da crise internacional que avançou, por todos os lados, e com força crescente, sobre o governo Lula (2003-2010), chegando ao pico (de hoje!) no governo da sua sucessora Dilma Rousseff?

Eu acho que eles teriam se encolhido ainda mais do que nos tempos em que a crise estava circunscrita a alguns países e, no máximo, ao mercado de ações. Fico imaginando FHC e Malan olhando para os Estados Unidos em recessão (na prática), a Europa despedaçada, a Ásia inerte (especialmente o Japão), as bolsas despencando, a massa querendo quebrar tudo em Wall Street. Por muito menos, Gustavo Franco, um dos presidentes do BC sob FHC, vendia bilhões de dólares em poder do Brasil para segurar a paridade do real frente a moeda americana. Os juros, quando o economista Armínio Fraga chegou para arrumar a casa, tiveram de ser jogados para uma estratosfera superior a 40%, de modo a que investimentos estrangeiros aqui permanecessem. As medidas eram defensivas.

Às vésperas da posse de Lula para seu primeiro mandato, entrevistei o então indicado presidente do BC Henrique Meirelles. E ele disse que estava na hora de aumentarmos as nossas reservas em dólar. Deixou o cargo, oito anos depois, com mais de US$ 200 bi em caixa. Em verdinhas!

Lula, desde o primeiro dia, apostou firme no crescimento do mercado interno (o que FHC só fizera lá atrás, na formulação do real sob a presidência do saudoso Itamar Franco). E deu nisso que estamos vendo agora, para que eu não me alongue: o Brasil acaba de ter sua nota de classificação de risco elevada pela Standard & Poor´s. Um tucano, se alcançasse esse feito, acho que enquadraria em moldura dourada o telegrama de comunicação da decisão. Penso que Lula nem ligou. Dilma fez sinal de positivo, e antes fora à Europa apontar que crescer é o remédio para enfrentar a crise – o que despertou em José Serra o comentário de que a presidente havia sido, no mínimo, imodesta. “Isso não é assim”, disse ele.

Eu acho que é, sim, assim mesmo que se faz. Como fez Lula, como teria feito Brizola, como faz Dilma, o que a gente sabe que Getúlio construiu, o jeito de Juscelino agir. O Brasil não tem tamanho para ficar debaixo de uma mesa, acocorado, esperando que as crises passem sem nos perceber. O Brasil que eu reconheço como jornalista há mais de 30 anos é esse que acredita em si mesmo, independentemente das condições externas. Quem, no comando, acelerou para ultrapassar as dificuldades, fez muito mais certo, a meu ver, do que os que se preocuparam mais com a defesa do que o ataque, descrentes da nossa própria força. Em atenção aos leitores que até aqui chegaram, resolvi ocupar esse espaço para deixar claro, de vez, sobre que lado estou. É o lado do povo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabéns pelo texto. O último parágrafo define bem. Ficar embaixo da mesa ou botar a cara a tapa? Muito bom!!