29 junho 2012

Foi golpe o que ocorreu no Paraguai, diz alto representante do Mercosul

ELEONORA DE LUCENA - Folha

Foi golpe o que ocorreu no Paraguai. As classes tradicionais hegemônicas promovem um neogolpismo na América do Sul e a democracia está em risco na região. Fernando Lugo caiu porque queria fazer uma reforma agrária que contrariava interesses.

A visão é do diplomata Samuel Pinheiro Guimarães Neto, alto-representante geral do Mercosul e ex-secretário-geral do Itamaraty (2003-2009).

Para ele, o novo presidente paraguaio, Federico Franco, representa a oligarquia agrária, interesses ligados ao contrabando e é defensor de ligações mais estreitas com os EUA.

Folha - Como o sr. define o que ocorreu no Paraguai?

Samuel Pinheiro Guimarães Neto - Foi golpe. Há um neogolpismo na América do Sul, promovido pelas classes tradicionais hegemônicas que enfrentam governos populares.

Essas classes tradicionais, diante da vitória de candidatos progressistas, constroem toda uma teoria de que foram eleitos, mas não governam democraticamente; de que fazem políticas populistas; de que são contra a liberdade de imprensa (deles) e assim por diante. Constroem e favorecem na sua mídia uma imagem de que tais governos são na realidade ditaduras e criam o clima para sua derrubada, com auxílio muitas vezes externo.

O que está por trás da queda de Lugo? Os apoiadores do ex-presidente afirmam que ele caiu porque contrariou fortes interesses: os grandes proprietários de terra, as grandes companhias, os Estados Unidos?

Essa análise faz sentido?

A reforma agrária pretendida pelo governo Lugo seria uma das principais razões para o golpe assim como o inicio do movimento popular para reformar o sistema eleitoral de listas fechadas que beneficia oligarquias agrárias e corruptas ligadas ao "comércio" exterior.

Certamente, a queda de Lugo não contraria a política exterior americana assim como a erosão do poder e da unidade do Mercosul e o enfraquecimento dos governos progressistas do Uruguai, do Brasil e da Argentina. O projeto dos EUA para a América do Sul não é o Mercosul, e sim as "mini-Alcas" bilaterais, Aliança do Pacifico.

Quais são os interesses representados por Franco?

Franco representa os interesses da oligarquia agrária, representados pelos partidos tradicionais, Liberal e Conservador, e os interesses ligados ao comércio exterior informal, ao contrabando, além disto, é conhecido defensor de relações mais estreitas do Paraguai com os Estados Unidos e da celebração de um acordo de livre comércio.

A reação dos movimentos populares ficou aquém do esperado? Lugo perdeu apoio interno?

O Paraguai é um dos países, talvez o país, onde há maior concentração de propriedade nos meios de comunicação. Assim, a reação dos movimentos populares, tomados de surpresa pelo golpe, não foi divulgada. Todavia, é certo que o apoio popular ao governo de Fernando Lugo no Paraguai é amplo e sua nova resistência ao golpe mobilizará esses movimentos.

A democracia está em risco na América Latina?

Sim, permanentemente. A América Latina é o continente de maior concentração de renda e riqueza do mundo. Em regimes democráticos, os candidatos progressistas (de fato ou de fachada) são eleitos para os cargos majoritários (Presidentes) enquanto que os candidatos, que representam as classes hegemônicas tradicionais, controlam os legislativos.

A tentativa de realizar programas populares sociais, que implicam a distribuição de renda (e de riqueza), de controle do sistema financeiro e de democratização dos meios de comunicação, encontra forte resistência e aí se iniciam as manobras do neogolpismo, inclusive por vezes com firme apoio e até financiamento externo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Movimento popular

No Paraguai, o povo se organiza e continua a luta contra os golpistas, veja a seguir no endereço (URL) abaixo indicado.

http://paraguayresiste.com/

Paulina Paraupaba
01-07-2012