Neste domingo, François Hollande conquistou uma das maiores votações conseguidas até hoje por um candidato socialista no primeiro turno das eleições na França. A partir de agora, as chaves da vitória estão, para Sarkozy, nas mãos da extrema-direita, e, para Hollande, nas de Jean-Luc Mélenchon e sua Frente de Esquerda, além dos votos de centro. Os 20% de Marine Le Pen representam quase um terremoto político. Esse resultado deve muito a Sarkozy e ao racismo de Estado que o próprio presidente encarnou. O artigo é de Eduardo Febbro, direto de Paris.
Eduardo Febbro - De Paris
Paris - “As pétalas da rosa de abril são mais numerosas que os cravos azuis de maio”. As redes sociais repercutiram essa mensagem para burlar a proibição de difundir resultados antes das 8 horas da noite e anunciar assim a vitória do candidato socialista François Hollande no primeiro turno das eleições presidenciais francesas. Mas a celebração não levou em conta a flor negra, o terremoto político que representa o resultado da extrema direita da Frente nacional, cuja candidata, Marine Le Pen, obteve um resultado histórico de 20%. Nicolas Sarkozy perdeu sua aposta e François Hollande ganhou a sua. Com 28,5% dos votos, o candidato do PS supera o presidente francês (26,6%) do primeiro posto e o impede de cumprir o objetivo que ele mesmo fixou: sair deste domingo na liderança da consulta, “ainda que seja por um fio de cabelo”, para, a partir daí, redinamizar a direita e ganhar o segundo turno no próximo dia 6 de maio.
A sanção para Sarkozy é indiscutível: o presidente obteve 5 pontos menos que na eleição de 2007. Ao contrário, François Hollande entrou na história não só porque se converteu em uma carta sólida para a socialdemocracia europeia, mas também porque conquistou uma das maiores votações conseguidas até hoje por um candidato socialista no primeiro turno da eleição. Só é superado por François Miterrand, que obteve 34% em 1988.
No entanto, o poderoso percentual da extrema-direita e o baixo volume de votos obtido pelo candidato da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon (11,5%), convidam à moderação. Hoje começa uma nova campanha e como já demonstrou ao longo de seus cinco anos de mandato, Nicolas Sarkozy não terá nenhuma dúvida em sair a tentar conquistar os votos dessa França que vê na xenofobia, no ódio ao próximo e à imigração, na segurança máxima, no rechaço à Europa e no desprezo aos franceses filhos de pais estrangeiros uma alternativa política.
Essa eleição representa um marco em muitas coisas: é a primeira vez que um presidente que concorre à reeleição não sai na frente no primeiro turno; Marine Le Pen pulverizou o recorde de votos que seu pai e fundador da Frente Nacional, Jean Marie Le Pen, havia obtido em 2002, mais de 16,9%. Ao mesmo tempo, quase duplicou o volume de eleitores que seu pai obteve em 2007 (10,44%).
Neste domingo, os eleitores deram à social democracia francesa um forte respaldo que permite aos seus partidários sonhar sim que o pesadelo se afaste por completo das regiões do sonho. A partir de agora, as chaves da vitória estão, para Sarkozy, nas mãos da extrema-direita, e, para Hollande, nas de Jean-Luc Mélenchon e sua Frente de Esquerda. A guerra para o segundo turno entre Sarkozy e Hollande começou apenas algumas horas depois ao anúncio dos primeiros prognósticos sobre o segundo turno. Estes, mais uma vez, colocaram Hollande quase nove pontos acima de Sarkozy. Este propôs que sejam realizados três debates de hoje até o dia 6 de maio. Hollande respondeu: “não é porque um candidato tenha tido um mal resultado que vamos mudar as regras”. Em seu discurso á noite, Sarkozy disse: “o momento crucial chegou, o da confrontação de projetos e o da escolha das personalidades”. Em sua aparição ante os militantes, Hollande pronunciou um discurso equilibrado e otimista. “Temos todas as condições de obter uma vitória. Esta noite, com o voto dos franceses, converto-me no candidato de quem quer abrir uma nova página”.
Com um centro que diminuiu em relação a 2007 (caiu de 18,57% para os 8,9% atuais), uma candidata ecologista sem peso (2,3%), e uma extrema-esquerda periférica, a reserva de votos está na dupla Marie Le Pen-Mélenchon. Sarkozy perdeu a equação eleitoral que havia fixado para sua campanha: sair em primeiro para relançar uma “dinâmica” e mudar a correlação de forças para o segundo turno. No entanto, nem por isso, já perdeu a eleição. Somados, os votos da extrema-direita e os de Sarkozy chegam quase a 47%. Resta a ambiguidade do centro e as consignas para o seis de maio de cada candidatura.
A candidata ecologista Eva Joly já chamou ou voto para Hollande. Fim a seus compromissos e sem enrolações, Jean-Luc Mélenchon fez o mesmo em um aceso discurso no qual pediu a seus militantes para não se fixarem em comentários e detalhes: “convido-os a nos reencontrarmos no dia 6 de maio sem pedir nada em troca para derrotar Sarkozy”, disse Mélenchon. O candidato centrista François Bayrou não fez declarações de apoio e Marine Le Pen disse que só fará isso no dia 1º de maio.
“A batalha da França acaba de começar (...) Nada será como antes. Contra o que se esperava, os franceses se convidaram para sentar na mesa das elites”, disse neste domingo à noite a líder da FN. Esses resultados constituem uma indiscutível vitória da linha política que adotou e que consistiu em tirar o manto do diabo com o qual seu pai havia envolvido a Frente Nacional. A extrema direita é hoje uma corrente política totalmente normalizada, massivamente aceita e cuja pujança eleitoral influenciará na definição do destino político do país.
Nicolas Sarkozy saiu derrotado, mas com um salva-vidas ao alcance. O resultado da Frente Nacional deve muito a sua política, ao racismo de Estado que o próprio presidente encarnou, aos incontáveis ataques contra os estrangeiros e aos muçulmanos, à permanente raiva com que tratou aos homens e mulheres que vieram para a França, por uma ou outra razão, de todos os cantos do planeta. Não foi ele quem tirou proveito disso por enquanto, mas sim Marine Le Pen. A estratégia sarkozista foi derrotada duas vezes: ele ficou em segundo e não obteve o respaldo dos votos da Frente nacional. Em 2007, Sarkozy recuperou os votos da extrema-direita e com eles e suas promessas garantiu sua vitória. Cinco anos mais tarde, esses eleitores voltaram à fonte original.
O presidente candidato tem uma dupla missão para ser reeleito: seduzir o centro e voltar à pesca de votos na extrema-direita. A tarefa do Partido Socialista será trabalhosa de hoje até o dia 6 de maio. François Hollande obteve um dos resultados mais amplos de um candidato socialista no primeiro turno. O total de votos das listas de esquerda no primeiro turno de 2007 chegou a 36,4%, bem menos do que os quase 44% deste domingo. A perspectiva é alentadora. A meta do PS são os eleitores do centro e alguns votos da extrema-direita. Estes, mais do que um voto de adesão às teses de Marine Le Pen, constituem uma manifestação de rechaço ao sistema político e de medo frente à crise.
A Frente Nacional conta entre seus eleitores com operários que foram da CGT e até mesmo do Partido Comunista. A crise acentuou o fenômeno da “transfrontalização” entre os partidos, o que beneficiou amplamente a extrema-direita. As pesquisas assinalam hoje que cerca de 48% dos eleitores frentistas votariam em Hollande no próximo dia seis de maio. Os socialistas franceses renasceram com um candidato pelo qual ninguém apostava um centavo. Milagre rosa. A direção do partido já colocou em marcha a estratégia discursiva para as próximas duas semanas. Repetir, como fez o ex-ministro socialista da Cultura, Jacques Lang: “Sarkozy contribuiu para legitimar as ideias da Frente nacional e não fez mais do que aumentar a xenofobia e a divisão”.
O domingo teve um momento de sublime revelação na rua Solferino, onde está a sede do PS, um desses instantes no qual se pressente que o destino passa com corpo e alma. Quando Jean-Luc Mélenchon apareceu nas telas das televisões, os militantes socialistas ficaram mudos. O futuro dependia do que ele iria dizer. A televisão pública transmitiu o discurso e dividiu a tela em duas partes: à direita estava Mélanchon, à esquerda, o porta-voz de François Hollande, Manuel Vals, e a candidata de 2007 e ex-companheira de Hollande, Ségolène Royal. Estavam pálidos e tensos enquanto escutavam Mélenchon lançar seus dardos. Um silêncio sepulcral envolveu a sede do PS, onde os militantes escutavam o discurso, hipnotizados pelo temor. Até que chegou a frase liberadora, os gritos e os aplausos quando o candidato da Frente de Esquerda convocou a todos, sem ambiguidade e com uma enorme nobreza, a derrotar Sarkozy.
Outra campanha começa. Outro país pode surgir dentro de duas semanas. É preciso atravessar ainda um campo semeado de medo, de populismo e de um liberalismo cheio de ajustes recessivos. Este domingo deixa duas lições: François Hollande ressuscitou o socialismo, e Sarkozy a extrema-direita.
Tradução: Katarina Peixoto
A sanção para Sarkozy é indiscutível: o presidente obteve 5 pontos menos que na eleição de 2007. Ao contrário, François Hollande entrou na história não só porque se converteu em uma carta sólida para a socialdemocracia europeia, mas também porque conquistou uma das maiores votações conseguidas até hoje por um candidato socialista no primeiro turno da eleição. Só é superado por François Miterrand, que obteve 34% em 1988.
No entanto, o poderoso percentual da extrema-direita e o baixo volume de votos obtido pelo candidato da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon (11,5%), convidam à moderação. Hoje começa uma nova campanha e como já demonstrou ao longo de seus cinco anos de mandato, Nicolas Sarkozy não terá nenhuma dúvida em sair a tentar conquistar os votos dessa França que vê na xenofobia, no ódio ao próximo e à imigração, na segurança máxima, no rechaço à Europa e no desprezo aos franceses filhos de pais estrangeiros uma alternativa política.
Essa eleição representa um marco em muitas coisas: é a primeira vez que um presidente que concorre à reeleição não sai na frente no primeiro turno; Marine Le Pen pulverizou o recorde de votos que seu pai e fundador da Frente Nacional, Jean Marie Le Pen, havia obtido em 2002, mais de 16,9%. Ao mesmo tempo, quase duplicou o volume de eleitores que seu pai obteve em 2007 (10,44%).
Neste domingo, os eleitores deram à social democracia francesa um forte respaldo que permite aos seus partidários sonhar sim que o pesadelo se afaste por completo das regiões do sonho. A partir de agora, as chaves da vitória estão, para Sarkozy, nas mãos da extrema-direita, e, para Hollande, nas de Jean-Luc Mélenchon e sua Frente de Esquerda. A guerra para o segundo turno entre Sarkozy e Hollande começou apenas algumas horas depois ao anúncio dos primeiros prognósticos sobre o segundo turno. Estes, mais uma vez, colocaram Hollande quase nove pontos acima de Sarkozy. Este propôs que sejam realizados três debates de hoje até o dia 6 de maio. Hollande respondeu: “não é porque um candidato tenha tido um mal resultado que vamos mudar as regras”. Em seu discurso á noite, Sarkozy disse: “o momento crucial chegou, o da confrontação de projetos e o da escolha das personalidades”. Em sua aparição ante os militantes, Hollande pronunciou um discurso equilibrado e otimista. “Temos todas as condições de obter uma vitória. Esta noite, com o voto dos franceses, converto-me no candidato de quem quer abrir uma nova página”.
Com um centro que diminuiu em relação a 2007 (caiu de 18,57% para os 8,9% atuais), uma candidata ecologista sem peso (2,3%), e uma extrema-esquerda periférica, a reserva de votos está na dupla Marie Le Pen-Mélenchon. Sarkozy perdeu a equação eleitoral que havia fixado para sua campanha: sair em primeiro para relançar uma “dinâmica” e mudar a correlação de forças para o segundo turno. No entanto, nem por isso, já perdeu a eleição. Somados, os votos da extrema-direita e os de Sarkozy chegam quase a 47%. Resta a ambiguidade do centro e as consignas para o seis de maio de cada candidatura.
A candidata ecologista Eva Joly já chamou ou voto para Hollande. Fim a seus compromissos e sem enrolações, Jean-Luc Mélenchon fez o mesmo em um aceso discurso no qual pediu a seus militantes para não se fixarem em comentários e detalhes: “convido-os a nos reencontrarmos no dia 6 de maio sem pedir nada em troca para derrotar Sarkozy”, disse Mélenchon. O candidato centrista François Bayrou não fez declarações de apoio e Marine Le Pen disse que só fará isso no dia 1º de maio.
“A batalha da França acaba de começar (...) Nada será como antes. Contra o que se esperava, os franceses se convidaram para sentar na mesa das elites”, disse neste domingo à noite a líder da FN. Esses resultados constituem uma indiscutível vitória da linha política que adotou e que consistiu em tirar o manto do diabo com o qual seu pai havia envolvido a Frente Nacional. A extrema direita é hoje uma corrente política totalmente normalizada, massivamente aceita e cuja pujança eleitoral influenciará na definição do destino político do país.
Nicolas Sarkozy saiu derrotado, mas com um salva-vidas ao alcance. O resultado da Frente Nacional deve muito a sua política, ao racismo de Estado que o próprio presidente encarnou, aos incontáveis ataques contra os estrangeiros e aos muçulmanos, à permanente raiva com que tratou aos homens e mulheres que vieram para a França, por uma ou outra razão, de todos os cantos do planeta. Não foi ele quem tirou proveito disso por enquanto, mas sim Marine Le Pen. A estratégia sarkozista foi derrotada duas vezes: ele ficou em segundo e não obteve o respaldo dos votos da Frente nacional. Em 2007, Sarkozy recuperou os votos da extrema-direita e com eles e suas promessas garantiu sua vitória. Cinco anos mais tarde, esses eleitores voltaram à fonte original.
O presidente candidato tem uma dupla missão para ser reeleito: seduzir o centro e voltar à pesca de votos na extrema-direita. A tarefa do Partido Socialista será trabalhosa de hoje até o dia 6 de maio. François Hollande obteve um dos resultados mais amplos de um candidato socialista no primeiro turno. O total de votos das listas de esquerda no primeiro turno de 2007 chegou a 36,4%, bem menos do que os quase 44% deste domingo. A perspectiva é alentadora. A meta do PS são os eleitores do centro e alguns votos da extrema-direita. Estes, mais do que um voto de adesão às teses de Marine Le Pen, constituem uma manifestação de rechaço ao sistema político e de medo frente à crise.
A Frente Nacional conta entre seus eleitores com operários que foram da CGT e até mesmo do Partido Comunista. A crise acentuou o fenômeno da “transfrontalização” entre os partidos, o que beneficiou amplamente a extrema-direita. As pesquisas assinalam hoje que cerca de 48% dos eleitores frentistas votariam em Hollande no próximo dia seis de maio. Os socialistas franceses renasceram com um candidato pelo qual ninguém apostava um centavo. Milagre rosa. A direção do partido já colocou em marcha a estratégia discursiva para as próximas duas semanas. Repetir, como fez o ex-ministro socialista da Cultura, Jacques Lang: “Sarkozy contribuiu para legitimar as ideias da Frente nacional e não fez mais do que aumentar a xenofobia e a divisão”.
O domingo teve um momento de sublime revelação na rua Solferino, onde está a sede do PS, um desses instantes no qual se pressente que o destino passa com corpo e alma. Quando Jean-Luc Mélenchon apareceu nas telas das televisões, os militantes socialistas ficaram mudos. O futuro dependia do que ele iria dizer. A televisão pública transmitiu o discurso e dividiu a tela em duas partes: à direita estava Mélanchon, à esquerda, o porta-voz de François Hollande, Manuel Vals, e a candidata de 2007 e ex-companheira de Hollande, Ségolène Royal. Estavam pálidos e tensos enquanto escutavam Mélenchon lançar seus dardos. Um silêncio sepulcral envolveu a sede do PS, onde os militantes escutavam o discurso, hipnotizados pelo temor. Até que chegou a frase liberadora, os gritos e os aplausos quando o candidato da Frente de Esquerda convocou a todos, sem ambiguidade e com uma enorme nobreza, a derrotar Sarkozy.
Outra campanha começa. Outro país pode surgir dentro de duas semanas. É preciso atravessar ainda um campo semeado de medo, de populismo e de um liberalismo cheio de ajustes recessivos. Este domingo deixa duas lições: François Hollande ressuscitou o socialismo, e Sarkozy a extrema-direita.
Tradução: Katarina Peixoto
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