05 janeiro 2012

Por que Serra é tão detestado



por Paulo Nogueira

Uma unanimidade

Por que Serra é tão detestado?

Me chamou a atenção a alegria com que muita gente recebeu as controvertidas denúncias contra Serra no livro A Privataria Tucana. Me parece que para muitos a principal virtude do livro consiste em atacar Serra.

Único vê-lo no papel de privatizador, ele que sempre pareceu contrariado com as privatizações e que jamais se identificou com o ideário neoliberal. Serra é o clássico ‘dirigista’, alguém que acha que o país deve ser guiado de cima para baixo por um Estado forte. Há, aí, uma comunhão de idéias entre ele e o que foi o mais esclarecido presidente nos anos militares, Ernesto Geisel.

Os jornalistas não gostam de Serra por um motivo óbvio: se puder, ele liga para os donos para tentar suspender uma reportagem que ele suspeite que não o tratará como herói. Caso saia um artigo que o irrite, ele também responde com ligações privadas para os donos ou os chefes do autor. Até em bobagens. Uma vez, quando trabalhava na Exame, dei a um texto sobre mais uma derrota eleitoral de Serra um título extraído de um poema de Gonçalves Dias: “Ainda uma vez, adeus”. Meu chefe na época, Antonio Machado, me avisou que Serra tinha ligado para se queixar de mim.

Muitos jornalistas atribuem sua demissão a pedidos de Serra. Em minha carreira, só vi alguém com o mesmo perfil: Delfim Netto, o czar da economia em boa parte do regime militar. Os jornalistas sabíamos que Delfim não hesitava em pedir cabeças quando contrariado com algum texto.

Sabemos, então, por que Serra é rejeitado pelos jornalistas. E pelos demais?

Bem, Serra parece reunir todas as características que fazem as pessoas desgostar de alguém. Tem um claro ar de superioridade, sem que haja razões para isso. Serra é, por formação, economista, mas jamais produziu um livro original, com idéias econômicas inovadoras. Sua arrogância se sustenta muito mais num caráter ególatra do que em bases de realidade, e isso incomoda duplamente. Se é difícil suportar um gênio difícil, pior ainda é aturar uma pessoa normal que se comporta como gênio.

Serra é, também, invejoso. Ele não participou da equipe que fez o Plano Real, e por isso jamais reconheceu nele a importância histórica de devolver aos brasileiros uma moeda que não se corroía continuamente.

Também não é grato. Em 2002, em sua campanha fracassada, jamais deixou claro aos brasileiros que se alinhava com o homem que viabilizara sua candidatura: Fernando Henrique Cardoso. Compare com a atitude de Dilma perante Lula. Dilma, numa cartinha recente a FHC, disse muito mais sobre a importância dele como presidente do que Serra em toda uma vida em que ambos estiveram na mesma trincheira.

A todos os atributos negativos, Serra acrescentou na última campanha um outro: a hipocrisia. Ele quis parecer um homem do povo, alguém que gosta de estar no meio das pessoas numa feira comendo pastel e falando do último capítulo de novela.

Não colou.

Nem vou remeter ao farisaísmo presente na patética tentativa de transformar uma bolinha de papel num atentado na última campanha. Numa hipótese benevolente, isso foi fruto ao mesmo tempo do marqueteiro de Serra e de seu próprio desespero diante das pesquisas que já o davam como morto. Foi um horror, é verdade, mas com atenuantes. Por isso passemos por cima do falso atentado. Fiquemos com a essência: antipatizar com Serra é uma das raras coisas comuns aos brasileiros.

Dizer que o brasileiro não sabe votar é um clichê. Mas não ter levado Serra ao Planalto por duas vezes é uma evidência de que o brasileiro sabe pelo menos em quem não votar.

http://www.diariodocentrodomundo.com.br

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Por Luis Nassif

Por questão de justiça: apesar de seu inegável poder, há muito mais lenda do que realidade na ação de Delfim junto à mídia.

Sou testemunha disso.

Em 1981 Delfim salvou o Estadão da bancarrota. Como agradecimento, mensalmente o jornal fazia uma entrevista de duas páginas com ele, com os jornalistas levantando bola. A entrevista era conjunta com o Jornal da Tarde.

Na época, propus ao Ruyzito Mesquita me mandar junto com a equipe. Estava no JT e começava a me soltar como articulista. Levantei vários temas sobre a situação econômica que não chegavam a Brasilia, porque o JT era basicamente local.

Graças a isso, conseguiu pegar Delfim em muitas pequenas armadilhas. A ponto de, em determinado momento, ele esmurrar a mesa.

O Estadão suprimiu as partes mais delicadas para ele, o JT deu na íntegra.

A reação de Delfim foi telefonar para Bernard Appy - editor de Economia do Estadão - para perguntar quem eu era. Nenhum pedido, nenhuma pressão, nenhuma ameaça.

Anos depois, ele me disse que respeitava muito a crítica que Aluizio Biondi lhe fazia nos tempos do Milagre. E jurava que jamais pressionou nenhuma empresa para tirar o emprego do Aluizio.

Aliás, seu estilo de cooptação era outro: aproximar-se dos jornalistas e seduzi-los com informações exclusivas.

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