22 novembro 2010

O papel de Lula no governo de Dilma

Ricardo Kotscho

Num ponto, pelo menos, as personalidades de Lula e Dilma são muito semelhantes: os dois são teimosos, não gostam muito de ouvir palpites e conselhos, e apreciam exercer a autoridade, às vezes de forma brusca, deixando claro quem manda.

Por isso mesmo, não dou crédito a esta história de que o governo Dilma será apenas um terceiro mandato de Lula com outro nome. Quem diz isso não conhece a Dilma nem o Lula.

Claro que o futuro ex-presidente estará sempre à disposição da presidente eleita para colaborar, ajudar na articulação política e nos momentos de crise, mas só quando for chamado por ela, por iniciativa dela, jamais dando uma de oferecido. Não é do feitio dele.

Os dois têm grande respeito e admiração um pelo outro _ Lula pela gestora Dilma e Dilma pelo líder político Lula. O atual presidente não atropelaria a autoridade de quem foi eleita por indicação dele mesmo para exercer o poder central em seu lugar. Até seus piores inimigos concordam que Lula pode ser chamado de tudo, menos de burro.

Dilma tem plena consciência de que deve o mandato a Lula e será fiel aos princípios do atual governo, que deverá manter, em especial na política econômica. Ninguém, nem eles, pode ter absoluta certeza sobre o futuro, mas não acredito num possível rompimento entre criador e criatura, como muitos já especulam, e outros nem disfarçam a torcida para que aconteça.

Até porque, um continua dependendo muito do outro: Dilma depende do apoio de Lula para governar em paz com seus aliados e Lula precisa que o governo Dilma dê certo para preservar sua credibilidade, a própria imagem e a do seu governo.

Por isso mesmo, e mais duas razões bem simples, Lula não deverá voltar a se candidatar em 2014:

* Se o governo Dilma for um sucesso, ela certamente será a candidata natural do PT à reeleição.

* Se tudo der errado, a imagem de Lula também será abalada porque, afinal, ele foi o mentor e o fiador da eleição de Dilma.

Mesmo na remota hipótese de vir a ser candidato e de ser eleito, Lula sabe que correria o sério risco de perder, num eventual terceiro mandato, o prestígio que conquistou nos dois primeiros, chegando a mais de 80% de aprovação popular _ o que é inédito e não deverá se repetir tão cedo. Seu lugar na história já está garantido. Para que arriscar?

Pelo menos nos primeiros tempos do governo Dilma, depois de um breve descanso, Lula deverá se dedicar mais a fazer política lá fora do que aqui dentro do país. O instituto que pretende criar tem como principal foco levar a experiência das políticas públicas e dos projetos sociais do seu governo para países pobres da América Latina e da África.

Além disso, Lula terá que correr o mundo em 2011 para receber dezenas de títulos de “doutor honoris causa” que lhe foram outorgados ao longo destes últimos oito anos. Por razões que desconheço, ele deixou para receber todos só depois de deixar o governo. O metalúrgico vai virar “doutor Lula”…

Nenhum comentário: