Num país em crise, com a economia sendo “passada a ferro” pelas regras do FMI num clima recessivo, em que os direitos sociais estão passando por uma poda sem precedentes, em que o presidente renunciou recentemente e a eleição indireta do novo foi um pesadelo para o governo, em que a popularidade do governo e dos seus partidos está lá embaixo, de repente o futebol, a seleção nacional e a Copa do Mundo passaram a ser uma milagrosa tábua de salvação.
Estamos falando, como estávamos acostumados, do Brasil? Não, da Alemanha.
Mas há mais nisso do que pensa a nossa vã filosofia. É que a seleção germânica passou por uma mudança de caráter das mais significativas.
O futebol alemão – o da sua seleção em particular – sempre foi associado a um blindado de artilharia – um Panzer, para ser mais exato. Troncudo, carrancoso, eficiente como um capitalista protestante e conservador como um bispo católico do partido de Bento XVI e, sobretudo, germânico, profundamente germânico: assim era o retrato do time alemão tradicional.
De repente, o que se vê? O time alemão jogando aberto, bonito, rápido, um time jovem de gente bonita. E sem o ex-capitão Ballack, o que, no meu entender deu-lhe mais mobilidade e jinga. Jinga? É, jinga. Não estou com aqueles que querem crucificar Dunga e o nosso time. Mas que faltou jinga, faltou, sobretudo naquele segundo tempo contra os holandeses em que fomos derrotados por uma laranja... mecânica. É um time que jogou certinho, só certinho. Só que o nosso, no segundo tempo, fez tudo errado. Desmanchou-se em campo.
Enquanto isso os lépidos e faceiros germânicos deram uma lição ímpar “a los hermanos de más Allá Del Plata”.
Pois vejam só: lépidos, faceiros e... coloridos! Não só o futebol deles é colorido: o time é colorido. Foi isso que mudou no time alemão: antes ele era um filme em louro e branco; no máximo havia uma cabeleira (sempre curta) morena que vinha lá dos fundos da Baviera. Agora, te tudo quanto é cor. Tem até uma cor que se chama Cacau – Herr Cacau – e que veio do Brasil. Tudo começou em 2004 quando, depois de um desempenho fraco no campeonato europeu, a Federação Alemã de Futebol decidiu "abrir" o time para os seus "oriundi".
11 dos 23 jogadores que a Alemanha despachou para a África do Sul têm ascendência próxima ou nasceram em terra estrangeira. Além do Claudemir Jerônimo Barreto – o Cacau, veja só:
Miroslav Klose, Lukas Podolski e Piotr Trochowski vieram da Polônia.
Mesut Özil, do Werder Bremen, é de ascendência turca, é muçulmano e recita o Corão antes de cada jogo.
Serdar Tasci também é de ascendência turca.
Mario Gómez tem o pai espanhol.
Sami Khedira tem o pai da Tunísia.
Dennis Aogo tem o pai nigeriano.
Jerome Boateng nasceu em Gana, filho de pai ganes e mãe alemã. Jogou contra o irmão, que era da seleção de Gana.
Marko Manin é sérvio de origem.
O time alemão está sendo descrito como o “retrato de uma nova Alemanha”.
Mas nem tudo são flores para o sucesso desse time que, vença ou perca a Copa, já marcou um gol pela integração.
É verdade que os bairros turcos de Berlim estão cobertos por bandeiras alemãs e da Turquia. O comerciante Youssef Bassal (relato do Berliner Zeitung), no bairro de Neukölln, resolveu pendurar um bandeirão alemão de 20 metros na fachada do prédio onde tem sua loja de telefonia celular. A bandeira já foi rasgada (duas vezes) por anônimos – mas que se dizem de esquerda, deixando mensagens alegando que aquilo é “nacionalismo” alemão. De esquerda? Sinceramente, para mim isso é racismo disfarçado.
Em compensação, há grupos neonazis que, pela internet, têm repudiado a seleção alemã. Outros dizem pejorativamente que ela é uma seleção da ONU, não da Alemanha. Mas o caso mais curioso é o daqueles que dizem que só torcem pela Alemanha quando os jogadores alemães puro-sangue tocam na bola...
Mas enquanto isso a maioria dos alemães, venham de onde vierem, se divertem a mil com os jogos – pelo menos até aqui, numa trajetória que foi empanada mas não cortada pela derrota para a Sérvia.
Dentre os mais velhos, há quem não goste desse embandeiramento geral das cidades, pois isso lhes traz recordações desagradáveis do passado.
Mas para os mais jovens, em geral, é uma festa.
A gente vê que de fato há uma nova Alemanha nascendo. Não das cinzas, mas entre as cinzas, sejam as eventuais do vulcão islandês, sejam as ameaçadoras da crise econômica e do pacote depre/regre/ssivo que sobre ela se abate.
Estamos falando, como estávamos acostumados, do Brasil? Não, da Alemanha.
Mas há mais nisso do que pensa a nossa vã filosofia. É que a seleção germânica passou por uma mudança de caráter das mais significativas.
O futebol alemão – o da sua seleção em particular – sempre foi associado a um blindado de artilharia – um Panzer, para ser mais exato. Troncudo, carrancoso, eficiente como um capitalista protestante e conservador como um bispo católico do partido de Bento XVI e, sobretudo, germânico, profundamente germânico: assim era o retrato do time alemão tradicional.
De repente, o que se vê? O time alemão jogando aberto, bonito, rápido, um time jovem de gente bonita. E sem o ex-capitão Ballack, o que, no meu entender deu-lhe mais mobilidade e jinga. Jinga? É, jinga. Não estou com aqueles que querem crucificar Dunga e o nosso time. Mas que faltou jinga, faltou, sobretudo naquele segundo tempo contra os holandeses em que fomos derrotados por uma laranja... mecânica. É um time que jogou certinho, só certinho. Só que o nosso, no segundo tempo, fez tudo errado. Desmanchou-se em campo.
Enquanto isso os lépidos e faceiros germânicos deram uma lição ímpar “a los hermanos de más Allá Del Plata”.
Pois vejam só: lépidos, faceiros e... coloridos! Não só o futebol deles é colorido: o time é colorido. Foi isso que mudou no time alemão: antes ele era um filme em louro e branco; no máximo havia uma cabeleira (sempre curta) morena que vinha lá dos fundos da Baviera. Agora, te tudo quanto é cor. Tem até uma cor que se chama Cacau – Herr Cacau – e que veio do Brasil. Tudo começou em 2004 quando, depois de um desempenho fraco no campeonato europeu, a Federação Alemã de Futebol decidiu "abrir" o time para os seus "oriundi".
11 dos 23 jogadores que a Alemanha despachou para a África do Sul têm ascendência próxima ou nasceram em terra estrangeira. Além do Claudemir Jerônimo Barreto – o Cacau, veja só:
Miroslav Klose, Lukas Podolski e Piotr Trochowski vieram da Polônia.
Mesut Özil, do Werder Bremen, é de ascendência turca, é muçulmano e recita o Corão antes de cada jogo.
Serdar Tasci também é de ascendência turca.
Mario Gómez tem o pai espanhol.
Sami Khedira tem o pai da Tunísia.
Dennis Aogo tem o pai nigeriano.
Jerome Boateng nasceu em Gana, filho de pai ganes e mãe alemã. Jogou contra o irmão, que era da seleção de Gana.
Marko Manin é sérvio de origem.
O time alemão está sendo descrito como o “retrato de uma nova Alemanha”.
Mas nem tudo são flores para o sucesso desse time que, vença ou perca a Copa, já marcou um gol pela integração.
É verdade que os bairros turcos de Berlim estão cobertos por bandeiras alemãs e da Turquia. O comerciante Youssef Bassal (relato do Berliner Zeitung), no bairro de Neukölln, resolveu pendurar um bandeirão alemão de 20 metros na fachada do prédio onde tem sua loja de telefonia celular. A bandeira já foi rasgada (duas vezes) por anônimos – mas que se dizem de esquerda, deixando mensagens alegando que aquilo é “nacionalismo” alemão. De esquerda? Sinceramente, para mim isso é racismo disfarçado.
Em compensação, há grupos neonazis que, pela internet, têm repudiado a seleção alemã. Outros dizem pejorativamente que ela é uma seleção da ONU, não da Alemanha. Mas o caso mais curioso é o daqueles que dizem que só torcem pela Alemanha quando os jogadores alemães puro-sangue tocam na bola...
Mas enquanto isso a maioria dos alemães, venham de onde vierem, se divertem a mil com os jogos – pelo menos até aqui, numa trajetória que foi empanada mas não cortada pela derrota para a Sérvia.
Dentre os mais velhos, há quem não goste desse embandeiramento geral das cidades, pois isso lhes traz recordações desagradáveis do passado.
Mas para os mais jovens, em geral, é uma festa.
A gente vê que de fato há uma nova Alemanha nascendo. Não das cinzas, mas entre as cinzas, sejam as eventuais do vulcão islandês, sejam as ameaçadoras da crise econômica e do pacote depre/regre/ssivo que sobre ela se abate.
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