16 janeiro 2010

Por dentro da caixa de pandora


O material apreendido pela Polícia Federal reforça denúncias do delator Durval Barbosa e complica a situação do governador José Roberto Arruda

por Andrei Meireles e Marcelo Rocha Com Murilo Ramos

A Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, revelou em novembro um esquema de caixa dois e pagamentos de propina a políticos e outras autoridades em Brasília que movimentou milhões de reais. No primeiro ato, a operação tornou públicas cenas chocantes de corrupção mesmo num país acostumado a frequentes escândalos. Os vídeos com políticos do Distrito Federal escondendo dinheiro em sacolas, meias e até cueca foram gravados pelo ex-secretário de Relações Institucionais do governo Durval Barbosa. Durval entrou num programa de delação premiada do Ministério Público e, nas últimas semanas, prestou novos depoimentos. Além de dar mais detalhes, Durval também fez novas acusações sobre a rede criminosa que seria comandada pelo governador José Roberto Arruda, ex-DEM e atualmente sem partido. ÉPOCA agora teve acesso ao conteúdo do material apreendido pela PF no dia da operação.

Foram vasculhados empresas prestadoras de serviço, escritórios e residências de secretários do governo, casas e gabinetes de quatro deputados distritais. De gavetas e computadores, milhares de documentos foram retirados. São agendas com anotações de pagamentos a políticos, livro-caixa com a contabilidade que os investigadores suspeitam ser distribuição de propina, dossiês sobre corrupção em secretarias e empresas estatais, um mapa do loteamento político de mais de 3 mil cargos, remessas de dinheiro para o exterior e acertos para fraude em licitações públicas.

Na pilha de papéis, chama a atenção o material encontrado na casa e no gabinete de Domingos Lamoglia, conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Distrito Federal por causa do escândalo. Lamoglia foi o assessor mais próximo de Arruda nos últimos 20 anos. Até outubro de 2009, era seu chefe de gabinete e tinha o privilégio de ser o único auxiliar com escritório na residência oficial do go-vernador. Na casa de Lamoglia, num setor de mansões em Brasília, a PF apreendeu um livro-caixa, agendas e papéis com nomes e iniciais de políticos sempre relacionados a números que, para os investigadores, se referem a valores da suposta propina.

Numa agenda de 2009, na data de 24 de agosto, os registros de possíveis pagamentos foram separados em dois grupos: “Pessoais” e “Política”. Entre os “Pessoais” aparece a anotação “Severo=450”. Seria referência a Severo de Araújo Dias, dono do haras Sparta. A PF investiga a denúncia de que o proprietário oculto do haras seja Arruda. Em um depoimento à subprocuradora-geral da República Raquel Dodge, prestado em 9 de dezembro, Durval Barbosa afirmou que o haras foi comprado pelo governador como um presente para sua mulher, Flávia Arruda. Durval diz ter ouvido a confirmação do negócio de Heraldo Paupério, padrasto de Flávia e advogado do delator antes da deflagração da operação da PF.

ÉPOCA ouviu aliados e auxiliares próximos de Arruda. Sob a condição de não ser identificados, eles disseram que o verdadeiro dono do haras é Arruda. Contaram que, antes de o escândalo estourar, aos sábados pela manhã Arruda agendava compromissos oficiais em locais próximos à propriedade. Terminada a programação, o governador dispensava assessores, seguranças e motorista e seguia dirigindo o próprio carro até o haras.

No grupo “Política” há registros como “Pesquisas=100”, “Evangélicos=80” e “Fraterna=100”. Em outros documentos estão registrados pagamentos a pelo menos três institutos de pesquisa de opinião. Segundo os investigadores, “Fraterna” seria o Instituto Fraterna, ONG presidida pela mulher de Arruda. Durval afirmou ter recebido orientação do governador para usar 10% do que arrecadava de propina com em-presas de informática para financiar a entidade da primeira-dama, instalada em um espaço cedido por uma empresa estatal.

O Instituto Fraterna foi criado em abril de 2009, com o propósito declarado de reforçar ações sociais do governo. A vice-presidente é Anna Christina Kubitschek Pereira, mulher do vice-governador Paulo Octávio e neta do ex-presidente Juscelino Kubitschek. Outro associado da ONG é Marcos Sant’Ana Arruda, filho do governador. Arruda afirma que o instituto não recebe recursos públicos e não tem vínculos com o governo. O gabinete do go-vernador também nega que a ONG tenha recebido dinheiro de Durval.

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