12 novembro 2009

APAGÃO NA GLOBO

por Urariano Mota

Mal recuperados da macabra cobertura do acidente do avião da TAM – cobertura no sentido de que cadáveres se cobrem - , as notícias da Globo apostam agora suas fichas no esclarecimento que só tem um fim, de finalidade e the end: este governo é o culpado. E se atiram à versão, às versões, com uma aversão assustadora.

Numa rápida olhada e recuperação dos seus noticiários nas últimas 24 horas anotamos.

O Jornal da Globo da terça-feira esticou, no bom sentido de esticar a vítima, a notícia, sua jornada até depois de uma da manhã desta quarta-feira. Em lugar de luz, que luz, afinal estávamos no maior apagão da história, houve imagens escuras de São Paulo e do Rio, com tenebrosas entrevistas para melhor mergulho nas trevas. Os apresentadores faziam perguntas para induzir o entrevistado a admitir algum tipo de erro na administração do sistema elétrico, por vulnerabilidade, por natureza cruel ou qualquer outro motivo. Mas, diabo, entrevistados escolhidos ainda assim não dizem tudo o que os apresentadores desejam.

“Mas o senhor não acha... Veja bem, então, pode-se dizer... Por suas palavras podemos concluir...”. Até o fim do jornal, quando William Waack, o especialista em guerra fria desde o muro de Berlim, disse o que mais desejava. De olhos grandes e frios à trevas: “Haverá consequências políticas”. Salve, simpatia.

No rádio, enquanto o bicho papão ou papagão continuava, a jornalista, cientista política, economista, socióloga, filósofa e catastrófrica Lúcia Hippolito entrou ao vivo pela CBN/Globo. Direto da sua residência – da qual nos deu velas, velhas e belas indicações do quanto mora bem -, informou ao distinto público ouvinte que o problema do blackout ocorrera porque... tantantamtam: o presidente Lula autorizara a isenção de impostos da linha branca fazendo com que muitos aparelhos, geladeiras, máquinas de lavar, tudo quanto é branco em mãos erradas, sobrecarregassem o sistema! Salve, século dezenove. Os pobres, sempre os pobres, esses malditos em consumo desenfreado só podem desembocar em noites negras. Ô raça.

No Bom dia (?) Brasil desta quarta-feira, o porta-voz do general Figueiredo (lembram?), hoje porta solene da democracia mais radical, mais conhecido pelo nome de Alexandre Garcia, arrumou cúmplices para a culpa do governo: os índios e o MST teriam causado o apagão. Mais precisamente, no seu estilo de perguntar afirmando: “Vemos ameaças de índios e de MST a hidrelétricas e torres de transmissão. O que é preciso fazer para que se tenha segurança absoluta na energia elétrica?”. Notem que ele não pergunta se índios e MST foram culpados, a pergunta é outra: como ter segurança absoluta? Seria uma comédia, se não fosse trágico. Chegou a ser impressionante o tom geral de Miriam Leitão, Renato Machado (sim, ele, o mais culto e fino conhecedor de vinhos do Brasil), as suas caras, as caras-uniformes dos apresentadores do Bom dia. Bom dia, mesmo? Salve, Omar Cardoso.

Como nos tempo da ditadura militar, a imprensa do exterior teve melhor informação sobre o Brasil. Na BBC Brasil lemos:

“O chefe da divisão de operações do sistema elétrico do Paraguai, na Administradora Nacional de Eletricidade (Ande, equivalente à Eletrobrás), engenheiro Luis Alberto Villordo, disse à BBC Brasil que um ‘curto circuito’ no estado de São Paulo teria desencadeado a falta de energia no Brasil e no país vizinho....

Para Patterson, autor do livro Keeping the Lights On – Towards Sustainable Energy (‘Mantendo as Luzes Acesas – Em Direção à Energia Sustentável’, em tradução livre), mesmo países ricos sofrem com a mesma vulnerabilidade.

Ele cita grandes blecautes ocorridos em 2003 – nos Estados Unidos e no Canadá, em agosto, quando 55 milhões de pessoas foram afetadas, na Dinamarca e na Suécia, em setembro, com 5 milhões afetados, e na Itália, no fim de setembro, com 55 milhões afetados – como exemplo do problema.”

Ainda não vimos O Jornal Nacional, que é a melhor versão eletrônica da propaganda eleitoral do PSDB (em dúvida, comparem os programas do partido e as edições do JN sobre o MST). Mas boa coisa não vem. Já sabemos, pela experiência passada, o que virá. William, e como gostam de um Wiliam na apresentação, não repetirá que a culpa é dos pobres, índios e MST, porque isso é passado. Irá direito na fonte, sem intermediários. O culpado é Lula. Salve, garoto William Bonney.

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