07/08/2009
por Mino Carta, na Carta Capital
Pergunto aos meus botões se não seria o caso de Fernando Collor, o senador ex-presidente da República, reconsiderar suas apreciações negativas a respeito da mídia nativa. Advogado da causa de um colega da nossa Câmara dos Lordes, também ex-primeiro mandatário, o nunca assaz falado José Sarney de quem já foi desafeto, tem razões contingentes para suas atuais manifestações.
Não lhe caberia recordar, contudo, que a mídia nativa tanto se empenhou para guindá-lo ao trono vinte anos atrás? E quem cunhou, então, a definição “caçador de marajás”? A revista Veja, algo assim como a vanguarda de um sistema de comunicações que chegaria ao clímax com a manipulação do debate final entre Collor e Lula no estúdio global pelas mãos sagradas do nosso colega Roberto Marinho, hoje nome de um conjunto viário de São Paulo batizado pela ex-prefeita Marta Suplicy, petista da gema.
À época, a mídia foi muito além de generosa com Fernando Collor. Ou, diria ele, justa? Haverá quem se apresse a lembrar que em 1992 o abandonaria ao seu destino em nome de mazelas inomináveis. Aí a rapaziada excitada pela emissora do doutor Roberto sairia às ruas de cara pintada para exigir o impeachment. Assim se escreve a história do Brasil, pobre Brasil e fajuta história.
Se houver marajás, sabemos perfeitamente onde encontrá-los. São sultões, emires, xeques. A raia miúda, dos serviçais, está em outro nível, muito distante. Mas é nesta que mira a mídia, nunca seus patrões. Já os meus botões são dados a citações em latim, e soletram repetita juvant, as repetições ajudam.
Em novembro de 1990, sete meses depois da posse de Fernando Collor, a IstoÉ que eu então dirigia publicou uma vasta reportagem de capa assinada pelo redator-chefe Bob Fernandes, sobre as aventuras de PC Farias, o Richelieu do presidente. Bob passara dois meses na tocaia do cardeal, e alinhavava em várias páginas tudo aquilo, absolutamente tudo, que um ano e meio após o irmão de Collor, Pedro, diria em entrevista à Veja.
Os leitores não padecerão de espantos agudos ao saber, se já não imaginam, que ninguém repercutiu a reportagem de IstoÉ, bem ao contrário do que se deu com a entrevista de Pedro Collor. Insisto, um ano e meio depois. A única novidade ali eram os supositórios de cocaína. Na opinião dos graúdos, é evidente, em fins de 1990 o caçador de marajás ainda não passara da conta.
Recordemos, entretanto, que, a despeito do irmão recalcado e loquaz, a mídia se conformava, na proximidade do segundo semestre de 1992, com o definitivo enterro do episódio. Pedro não tinha provas e a CPI montada a partir das suas denúncias não conseguira encontrá-las. Em compensação, a sucursal de Brasília de IstoÉ, chefiada por João Santana, havia localizado o motorista Eriberto França e os documentos que provavam a ligação entre a Casa da Dinda e PC Farias.
Santana e eu entrevistamos Collor no Planalto em uma manhã de fim de junho. Sabíamos o que o esperava, levamos a situação como se não soubéssemos. Pois é, jornalistas às vezes são inconfiáveis. Deu-se, porém, que no sábado seguinte, quando IstoÉ foi às bancas, tanto com a entrevista presidencial quanto com as provas apresentadas por Eriberto, a mídia foi forçada a ir atrás. Deu no que deu, como se diz.
Hoje Fernando Collor está ao lado de José Sarney e, portanto, de Lula. Coisas da realpolitik. Como de hábito a mídia nativa empenha-se até o último sangue contra o ex-metalúrgico que se tornou o presidente em todos os tempos mais popular do Brasil. Donde, contra quem ela aprovou e apoiou, em outras situações, de Sarney a Collor. A nossa mídia não pratica o jornalismo, porta-se de verdade como facção política. Patéticos são os seus donos e apaniguados – sabujos, jagunços, escravos – a afirmar terem independência, equidistância, pluralismo etc. etc.
A realpolitik obriga a alianças daninhas em um país de outra forma ingovernável, onde em lugar de partidos há clubes recreativos voltados a interesses de casta. Mesmo assim, a mídia vende a ideia de que varões de Plutarco existem sim, sobretudo os dotados de asas inúteis, incompetentes para o voo. Talvez fosse da sua conveniência deter-se na observação do semblante hodierno do senador Arthur Virgílio.
Comentário meu: Quando terminei de ler o texto ,pensei: eu não gostaria de ter o Mino Carta como inimigo. Por outro lado, ser perseguida pela Veja, Globo, Ditabranda e Estadão seria um privilégio. Honra o curriculum de qualquer um. É como ter sido perseguido pelos militares e seus capangas de antigamente. Hoje, os antigos perseguidos são respeitados por sua integridade e correção.
por Mino Carta, na Carta Capital
Pergunto aos meus botões se não seria o caso de Fernando Collor, o senador ex-presidente da República, reconsiderar suas apreciações negativas a respeito da mídia nativa. Advogado da causa de um colega da nossa Câmara dos Lordes, também ex-primeiro mandatário, o nunca assaz falado José Sarney de quem já foi desafeto, tem razões contingentes para suas atuais manifestações.
Não lhe caberia recordar, contudo, que a mídia nativa tanto se empenhou para guindá-lo ao trono vinte anos atrás? E quem cunhou, então, a definição “caçador de marajás”? A revista Veja, algo assim como a vanguarda de um sistema de comunicações que chegaria ao clímax com a manipulação do debate final entre Collor e Lula no estúdio global pelas mãos sagradas do nosso colega Roberto Marinho, hoje nome de um conjunto viário de São Paulo batizado pela ex-prefeita Marta Suplicy, petista da gema.
À época, a mídia foi muito além de generosa com Fernando Collor. Ou, diria ele, justa? Haverá quem se apresse a lembrar que em 1992 o abandonaria ao seu destino em nome de mazelas inomináveis. Aí a rapaziada excitada pela emissora do doutor Roberto sairia às ruas de cara pintada para exigir o impeachment. Assim se escreve a história do Brasil, pobre Brasil e fajuta história.
Se houver marajás, sabemos perfeitamente onde encontrá-los. São sultões, emires, xeques. A raia miúda, dos serviçais, está em outro nível, muito distante. Mas é nesta que mira a mídia, nunca seus patrões. Já os meus botões são dados a citações em latim, e soletram repetita juvant, as repetições ajudam.
Em novembro de 1990, sete meses depois da posse de Fernando Collor, a IstoÉ que eu então dirigia publicou uma vasta reportagem de capa assinada pelo redator-chefe Bob Fernandes, sobre as aventuras de PC Farias, o Richelieu do presidente. Bob passara dois meses na tocaia do cardeal, e alinhavava em várias páginas tudo aquilo, absolutamente tudo, que um ano e meio após o irmão de Collor, Pedro, diria em entrevista à Veja.
Os leitores não padecerão de espantos agudos ao saber, se já não imaginam, que ninguém repercutiu a reportagem de IstoÉ, bem ao contrário do que se deu com a entrevista de Pedro Collor. Insisto, um ano e meio depois. A única novidade ali eram os supositórios de cocaína. Na opinião dos graúdos, é evidente, em fins de 1990 o caçador de marajás ainda não passara da conta.
Recordemos, entretanto, que, a despeito do irmão recalcado e loquaz, a mídia se conformava, na proximidade do segundo semestre de 1992, com o definitivo enterro do episódio. Pedro não tinha provas e a CPI montada a partir das suas denúncias não conseguira encontrá-las. Em compensação, a sucursal de Brasília de IstoÉ, chefiada por João Santana, havia localizado o motorista Eriberto França e os documentos que provavam a ligação entre a Casa da Dinda e PC Farias.
Santana e eu entrevistamos Collor no Planalto em uma manhã de fim de junho. Sabíamos o que o esperava, levamos a situação como se não soubéssemos. Pois é, jornalistas às vezes são inconfiáveis. Deu-se, porém, que no sábado seguinte, quando IstoÉ foi às bancas, tanto com a entrevista presidencial quanto com as provas apresentadas por Eriberto, a mídia foi forçada a ir atrás. Deu no que deu, como se diz.
Hoje Fernando Collor está ao lado de José Sarney e, portanto, de Lula. Coisas da realpolitik. Como de hábito a mídia nativa empenha-se até o último sangue contra o ex-metalúrgico que se tornou o presidente em todos os tempos mais popular do Brasil. Donde, contra quem ela aprovou e apoiou, em outras situações, de Sarney a Collor. A nossa mídia não pratica o jornalismo, porta-se de verdade como facção política. Patéticos são os seus donos e apaniguados – sabujos, jagunços, escravos – a afirmar terem independência, equidistância, pluralismo etc. etc.
A realpolitik obriga a alianças daninhas em um país de outra forma ingovernável, onde em lugar de partidos há clubes recreativos voltados a interesses de casta. Mesmo assim, a mídia vende a ideia de que varões de Plutarco existem sim, sobretudo os dotados de asas inúteis, incompetentes para o voo. Talvez fosse da sua conveniência deter-se na observação do semblante hodierno do senador Arthur Virgílio.
Comentário meu: Quando terminei de ler o texto ,pensei: eu não gostaria de ter o Mino Carta como inimigo. Por outro lado, ser perseguida pela Veja, Globo, Ditabranda e Estadão seria um privilégio. Honra o curriculum de qualquer um. É como ter sido perseguido pelos militares e seus capangas de antigamente. Hoje, os antigos perseguidos são respeitados por sua integridade e correção.
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