21 dezembro 2008

O banqueiro e a espada de Dâmocles O desembaraço de Jobim


Mauro Santayana

Os desmandos do senhor Daniel Dantas o transformaram, de reconhecido gênio das finanças, em um dos mais execrados brasileiros de sua geração. O juiz De Sanctis, ao condená-lo a 10 anos de prisão, mas deixando-o com o direito de recorrer em liberdade, não o poupou. A prisão, por mais desconfortável viesse a ser, não representaria pena maior do que a de esfalfar-se, em liberdade, na luta para eludir a Justiça e acompanhar o desmoronamento de seu império financeiro, apesar dos esforços de seus advogados – cada vez mais caros. O fundador do Opportunity não está sozinho no cumprimento dessa pena insólita. Todos os que dele foram cúmplices nos obscuros negócios de que participou, estejam ou não sendo processados pela Justiça, sentem a aguçada ponta da espada de Dâmocles tocar a moleira.

É fácil explicar a defesa que altos senhores fazem do banqueiro, desde o início envolvido com o poder político. Embora sem cargo no governo, o que lhes convinha, Dantas participava ativamente do grupo de meninos-prodígios da equipe econômica que Fernando Henrique montou ao ser nomeado ministro da Fazenda. Quando o ministro se fez presidente, deu ampla liberdade de ação aos rapazes, que planejaram, com reconhecida competência, o desmoronamento do Estado nacional. Foi a grande oportunidade do Opportunity. Logo no início trataram de "fazer os italianos – sócios de Daniel Dantas – na marra". Da Vale do Rio Doce às telecomunicações, passando pelo setor elétrico, não houve grande negócio de privatização de que o senhor Dantas e seus sócios (vindos da equipe que montara o plano nacional de desestatização) não participassem. Muitos deles se enriqueceram com bônus generosos, oferecidos por instituições que se envolveram, de uma ou de outra forma, no processo.

O presidente do STF estranhou que o juiz De Sanctis expusesse, em sua sentença, a suspeita de que Dantas tentara colocar naquele tribunal um agente infiltrado, e reagiu, solicitando ao procurador-geral da República que investigue a denúncia. É bom que essa investigação se faça. É também importante que investigadores da Suíça, da Inglaterra e dos Estados Unidos examinem as provas e indícios recolhidos pela Polícia Federal contra o banqueiro. Quantos mais olhos percorrerem o inquérito, melhor será para o prosseguimento das investigações, o encontro da verdade e o ressarcimento do Estado, se for o caso.

O caso Dantas está conturbando a vida nacional, e necessita ter seu desfecho judicial. A opinião pública já fez seu julgamento – e julgamento político. Para o trabalhador, que se exaure a fim de cumprir seus deveres de pai de família e cidadão, bastam as evidências, divulgadas por parte da mídia (como se sabe, o banqueiro conta com a solidariedade de alguns nomes conhecidos nos meios de comunicação) para que o seu juízo se faça. Pode ser que o senhor Dantas tenha atuado de acordo com a letra das leis – e nós sabemos que as leis sempre favorecem os poderosos – e escape da Justiça formal. Mas a cidadania não suporta a arrogância do homem de negócios e a proteção descabida que vem recebendo de grandes senhores da República. Tal desembaraço coloca em dúvida os poderes republicanos, porque em todos eles o senhor Dantas tem aliados conhecidos. A resposta dos cidadãos, no apoio declarado ao juiz que o condenou e ao delegado que o investigou, é a mais poderosa das sentenças condenatórias.

O ministro da Defesa gosta de ocupar todos os espaços. É provável que ele não tenha consultado o Itamaraty em sua decisão de fornecer foguetes ao Paquistão. Qualquer pessoa de bom senso sabe que não podemos vender nem mesmo armas leves ao Paquistão e a Índia, que têm conflitos territoriais não resolvidos (no caso da Caxemira) e se encontram sempre à beira de uma guerra. Além do mais, se não nos movessem preocupações éticas, deviam mover-nos razões pragmáticas. A Índia é nossa sócia no clube dos quatro grandes países emergentes, juntamente com a Rússia e a China, e devemos preservar essa aliança.

Por outro lado, Jobim parece inclinado a comprar aviões dos norte-americanos (que não nos repassam tecnologia e dos quais dependeremos de peças de reposição), em detrimento de aeronaves européias, de melhor desempenho, e de tecnologia aberta aos compradores. É outro negócio que não nos convém.

Fonte: JB

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