Álvaro Dias quebrou o decoro ao vazar e inventar "dossiê"
Em 1953, Carlos Lacerda, sem nada, em mesmo pretexto, para caluniar o governo Getúlio, falsificou uma carta – a famosa “Carta Brandi” - em que um suposto deputado argentino combinava com o então ministro do Trabalho, João Goulart, a instalação de uma “república sindicalista” no Brasil. Certamente, não seria por respeito à verdade que esse golpista deixaria o governo em paz. Na falta de alguma franja a que se agarrar, o patife inventou uma, falsificando uma carta para atingir o herdeiro político de Getúlio e futuro presidente do país. A pressa da oposição em encerrar CPMI dos cartões evidencia que agora há o que investigar. O governo não usou nenhum dado contra quem quer que seja.
Por Carlos Lopes, para a Hora do Povo
Depois de mais de meio século, Lacerda tem, enfim, no meio político, um seguidor no ramo da falsificação e da fraude mais abjeta. Um seguidor muito mais medíocre, apagado, parvo, ainda que com algumas propensões bem assemelhadas ao seu ídolo. Sabe-se que a história se repete sempre em forma de comédia. Assim, em vez de Lacerda, a reação hoje em dia só tem um certo Álvaro Dias para falsificar documentos e atribuir “dossiês” ao governo.
Isso foi o que emergiu dos depoimentos do assessor de Dias, André Fernandes, e do ex-secretário de Controle Interno da Casa Civil, Aparecido Pires, na terça-feira. Logo no dia seguinte, a oposição, depois de mais de dois meses de ninharias ridículas, mostrou sua firme disposição de acabar com a CPMI dos Cartões Corporativos. A quem beneficia isso? Certamente não é aos inocentes, à ministra Dilma ou ao governo em geral, nem a oposição faria nada para beneficiá-los.
Antes, não havia substância nessa CPI. Agora, há o que investigar. Foi exatamente porque não havia o que usar contra o governo Lula na questão dos cartões corporativos, que se inventou a história do dossiê - um estranho dossiê contra a oposição que não incriminava ninguém da oposição, que foi vazado para a imprensa pela oposição e que foi divulgado pela mídia da oposição.
Os depoimentos confirmaram que um funcionário da Casa Civil – sabe-se lá porque motivos – passou a um assessor de Álvaro Dias algumas planilhas que faziam parte de um banco de dados; que este assessor passou a Dias essas planilhas (somente a Dias, confirmou ele, e a ninguém mais); e que essa foi a origem da fraude que apareceu naquele chiqueiro da imprensa reacionária, a Veja.
Evidentemente, não é compatível com a função de senador da República a falsificação de um documento, a violação de sigilo e a prevaricação. E não há lei que o isente de responder por esses crimes.
“Prevaricação” (essa a que estamos nos referindo) é crime definido pelo Código Penal como “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal” (Art. 319, Cap. I, “Dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral”, Título XI, “Dos crimes praticados contra a administração pública”).
Ao tomar conhecimento das planilhas entregues por seu assessor, Dias estava obrigado a denunciar imediatamente o vazamento. Em vez disso, passou-as à “Veja”, usando-as para uma conspiração (ainda que pífia) contra o governo eleito legalmente, acumpliciado com mais alguns golpistas – no Congresso e, sobretudo, na mídia.
Não é verdade que todos os dados divulgados por Dias tenham deixado de ser sigilosos. Há, por exemplo, a identificação de quatro agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), designados por suas iniciais e seus CPFs - a partir dos quais é possível obter seus nomes no site da Receita Federal - com as quantias que eles manejaram das despesas secretas do governo. Se isso não é sigiloso, o que será?
Mais extensamente, a violação de sigilo não se dá apenas quando um dado é classificado oficialmente como “sigiloso”. O orçamento de uma família não é oficialmente sigiloso e nem por isso é lícito alguém espalhar cópias dele pela vizinhança. Da mesma forma, os dados armazenados na Casa Civil, ainda que não oficialmente sigilosos, não estão lá para serem divulgados. Ou será que é lícito, apesar de não ser um dado sigiloso, divulgar os pequenos gastos da antiga primeira-dama com fechos para sutiã? A quem interessa isso, senão somente às autoridades que são obrigadas a revisar os gastos da Presidência?
Por último, e mais importante, a falsificação. As planilhas que Dias entregou à “Veja” não são comprometedoras para Fernando Henrique ou para qualquer oposicionista. Elas realmente faziam parte de um banco de dados da Casa Civil, onde deviam ter ficado. Dar a esses dados e planilhas o caráter de “dossiê” é uma falsificação, uma falsificação ideológica – ou seja, tenta-se passar uma idéia falsa de alguma coisa. Em termos populares, tenta-se vender gato por lebre. O governo não usou um só desses dados contra alguém. Não os publicou, não os divulgou, não os vazou para a imprensa. Quem fez isso foi Dias, perpetrando uma falsificação, atribuindo ao governo o que este não fez.
Coluna
Porém, há mais do que falsificação “ideológica”. Nas planilhas divulgadas pela mídia, há uma coluna intitulada “observações”. A ministra Dilma Rousseff, em seu depoimento no Senado, revelou que essa coluna não existe nas planilhas da Casa Civil. Realmente, não teria lógica que a Casa Civil arquivasse planilhas com uma coluna de “observações” tipo “uíscão” ou “CAVIAR” (assim, em letras maiúsculas) ou “saldo para campanha eleitoral” (ao lado de uma compra de champanhe no governo Fernando Henrique).
Essa coluna, evidentemente, é o que faz com que as planilhas copiadas do banco de dados da Casa Civil tenham uma aparência de “dossiê”. Ou seja, a partir de planilhas e dados verdadeiros, perpetrou-se uma falsificação para torná-las um suposto “dossiê”. Sem essa coluna, a história perde credibilidade.
A questão é: quem acrescentou essa coluna nas planilhas? Se não foi o funcionário da Casa Civil (até porque essa coluna não existia nos originais, e nada em seu depoimento sugere que ele tivesse algum interesse nessa adulteração), ela deve ter sido feita no gabinete de Álvaro Dias – ou por ele, ou por seu assessor, ou pelos dois – para aumentar o apetite da mídia pelo material que obsequiosamente lhe ofereceu. A hipótese de que os falsários estejam na “Veja”, que tem uma alentada folha-corrida nesse tipo de coisa, esbarra no fato de que essa coluna também existe na cópia publicada pela “Folha de S. Paulo”, o outro órgão que também recebeu as planilhas, assim como na cópia divulgada pelo blogueiro Ricardo Noblat, que revelou a autoria de Álvaro Dias no vazamento.
Portanto, agora há, realmente, o que investigar. Os culpados têm de ser punidos. Não é aceitando a impunidade geral que se vai avançar na democracia. Então, que se remeta, para processo de cassação, o falsificador ao Conselho de Ética – na impossibilidade de enviá-lo à delegacia de polícia mais próxima.
Por Carlos Lopes, para a Hora do Povo
Depois de mais de meio século, Lacerda tem, enfim, no meio político, um seguidor no ramo da falsificação e da fraude mais abjeta. Um seguidor muito mais medíocre, apagado, parvo, ainda que com algumas propensões bem assemelhadas ao seu ídolo. Sabe-se que a história se repete sempre em forma de comédia. Assim, em vez de Lacerda, a reação hoje em dia só tem um certo Álvaro Dias para falsificar documentos e atribuir “dossiês” ao governo.
Isso foi o que emergiu dos depoimentos do assessor de Dias, André Fernandes, e do ex-secretário de Controle Interno da Casa Civil, Aparecido Pires, na terça-feira. Logo no dia seguinte, a oposição, depois de mais de dois meses de ninharias ridículas, mostrou sua firme disposição de acabar com a CPMI dos Cartões Corporativos. A quem beneficia isso? Certamente não é aos inocentes, à ministra Dilma ou ao governo em geral, nem a oposição faria nada para beneficiá-los.
Antes, não havia substância nessa CPI. Agora, há o que investigar. Foi exatamente porque não havia o que usar contra o governo Lula na questão dos cartões corporativos, que se inventou a história do dossiê - um estranho dossiê contra a oposição que não incriminava ninguém da oposição, que foi vazado para a imprensa pela oposição e que foi divulgado pela mídia da oposição.
Os depoimentos confirmaram que um funcionário da Casa Civil – sabe-se lá porque motivos – passou a um assessor de Álvaro Dias algumas planilhas que faziam parte de um banco de dados; que este assessor passou a Dias essas planilhas (somente a Dias, confirmou ele, e a ninguém mais); e que essa foi a origem da fraude que apareceu naquele chiqueiro da imprensa reacionária, a Veja.
Evidentemente, não é compatível com a função de senador da República a falsificação de um documento, a violação de sigilo e a prevaricação. E não há lei que o isente de responder por esses crimes.
“Prevaricação” (essa a que estamos nos referindo) é crime definido pelo Código Penal como “retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal” (Art. 319, Cap. I, “Dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral”, Título XI, “Dos crimes praticados contra a administração pública”).
Ao tomar conhecimento das planilhas entregues por seu assessor, Dias estava obrigado a denunciar imediatamente o vazamento. Em vez disso, passou-as à “Veja”, usando-as para uma conspiração (ainda que pífia) contra o governo eleito legalmente, acumpliciado com mais alguns golpistas – no Congresso e, sobretudo, na mídia.
Não é verdade que todos os dados divulgados por Dias tenham deixado de ser sigilosos. Há, por exemplo, a identificação de quatro agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), designados por suas iniciais e seus CPFs - a partir dos quais é possível obter seus nomes no site da Receita Federal - com as quantias que eles manejaram das despesas secretas do governo. Se isso não é sigiloso, o que será?
Mais extensamente, a violação de sigilo não se dá apenas quando um dado é classificado oficialmente como “sigiloso”. O orçamento de uma família não é oficialmente sigiloso e nem por isso é lícito alguém espalhar cópias dele pela vizinhança. Da mesma forma, os dados armazenados na Casa Civil, ainda que não oficialmente sigilosos, não estão lá para serem divulgados. Ou será que é lícito, apesar de não ser um dado sigiloso, divulgar os pequenos gastos da antiga primeira-dama com fechos para sutiã? A quem interessa isso, senão somente às autoridades que são obrigadas a revisar os gastos da Presidência?
Por último, e mais importante, a falsificação. As planilhas que Dias entregou à “Veja” não são comprometedoras para Fernando Henrique ou para qualquer oposicionista. Elas realmente faziam parte de um banco de dados da Casa Civil, onde deviam ter ficado. Dar a esses dados e planilhas o caráter de “dossiê” é uma falsificação, uma falsificação ideológica – ou seja, tenta-se passar uma idéia falsa de alguma coisa. Em termos populares, tenta-se vender gato por lebre. O governo não usou um só desses dados contra alguém. Não os publicou, não os divulgou, não os vazou para a imprensa. Quem fez isso foi Dias, perpetrando uma falsificação, atribuindo ao governo o que este não fez.
Coluna
Porém, há mais do que falsificação “ideológica”. Nas planilhas divulgadas pela mídia, há uma coluna intitulada “observações”. A ministra Dilma Rousseff, em seu depoimento no Senado, revelou que essa coluna não existe nas planilhas da Casa Civil. Realmente, não teria lógica que a Casa Civil arquivasse planilhas com uma coluna de “observações” tipo “uíscão” ou “CAVIAR” (assim, em letras maiúsculas) ou “saldo para campanha eleitoral” (ao lado de uma compra de champanhe no governo Fernando Henrique).
Essa coluna, evidentemente, é o que faz com que as planilhas copiadas do banco de dados da Casa Civil tenham uma aparência de “dossiê”. Ou seja, a partir de planilhas e dados verdadeiros, perpetrou-se uma falsificação para torná-las um suposto “dossiê”. Sem essa coluna, a história perde credibilidade.
A questão é: quem acrescentou essa coluna nas planilhas? Se não foi o funcionário da Casa Civil (até porque essa coluna não existia nos originais, e nada em seu depoimento sugere que ele tivesse algum interesse nessa adulteração), ela deve ter sido feita no gabinete de Álvaro Dias – ou por ele, ou por seu assessor, ou pelos dois – para aumentar o apetite da mídia pelo material que obsequiosamente lhe ofereceu. A hipótese de que os falsários estejam na “Veja”, que tem uma alentada folha-corrida nesse tipo de coisa, esbarra no fato de que essa coluna também existe na cópia publicada pela “Folha de S. Paulo”, o outro órgão que também recebeu as planilhas, assim como na cópia divulgada pelo blogueiro Ricardo Noblat, que revelou a autoria de Álvaro Dias no vazamento.
Portanto, agora há, realmente, o que investigar. Os culpados têm de ser punidos. Não é aceitando a impunidade geral que se vai avançar na democracia. Então, que se remeta, para processo de cassação, o falsificador ao Conselho de Ética – na impossibilidade de enviá-lo à delegacia de polícia mais próxima.
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